12/09/2019 - NOTA: Coren-RS repudia projeto de lei que dispõe sobre farmácias como estabelecimentos de saúde



O Conselho Regional de Enfermagem do Rio Grande do Sul (Coren-RS), no uso de suas atribuições legais e regimentais, vem a público posicionar-se contrário ao Projeto de Lei 112/2016, aprovado nesta quarta-feira (11/09) na Assembleia Legislativa do RS. O presente projeto, que dispõe sobre farmácias como estabelecimentos de saúde, serviços e procedimentos de apoio farmacêuticos permitidos em farmácias de qualquer natureza no Estado do Rio Grande do Sul e adota outras providências, traz em seu teor um rol de atividades a serem desenvolvidas em farmácias, dentre elas a vacinação, curativos e administração de medicamentos.

Assim, precisamos manifestar nossa preocupação com os riscos à saúde dos(as) usuários(as) que essas práticas podem gerar.

Segundo o Manual de Normas e Procedimentos para Vacinação do Ministério da Saúde 2014, o Programa Nacional de Imunizações (PNI) vem contribuindo para a redução da morbimortalidade causada pelas doenças imunopreveníveis, buscando a qualidade e a segurança dos produtos oferecidos para a manutenção e a disponibilidade, em tempo oportuno, dos imunobiológicos preconizados nos calendários e nas campanhas nacionais de vacinação para a população brasileira. Neste sentido, o PNI vem desenvolvendo e aperfeiçoando ferramentas para possibilitar a melhor instrumentalização e qualificação das atividades de vacinação em todo o território nacional.

Para que o processo de imunização se dê com segurança para o(a) profissional e usuário(a), é necessário uma série de cuidados técnicos antes, durante e após a administração do imunobiológico. Esses cuidados, segundo o Manual de Normas e Procedimentos para vacinação, dentro dos locais onde há aplicação de vacinas, deve ser desenvolvido por profissionais de Enfermagem treinados(as) e capacitados(as) para os procedimentos de manuseio, conservação, preparo e administração, registro e descarte dos resíduos resultantes das ações de vacinação. Profissionais esses(as) amparados(as) e respaldados(as) pela Lei 7.498/86 e seu decreto regulamentador 94.406/87.

Ainda, a implementação do Programa Nacional de Imunizações é um importante instrumento para alcance dos princípios e diretrizes da Atenção Básica como um conjunto de ações de saúde, no âmbito individual e coletivo, que abrange a promoção e a proteção da saúde, a prevenção de agravos, o diagnóstico, o tratamento, a reabilitação, a redução de danos e a manutenção da saúde com o objetivo de desenvolver uma atenção integral que impacte na situação de saúde e autonomia das pessoas e nos determinantes e condicionantes de saúde das coletividades.

Portanto, restringir o uso das vacinas somente com prescrição médica nas farmácias é um claro desrespeito ao Programa Nacional de Imunizações e princípios da Atenção Básica. Não podemos retomar as ideias de projetos como o do Ato Médico que defendem a supremacia de uma profissão em detrimento de outras, amparadas legalmente.

Em relação à administração de medicamentos é necessário que o profissional tenha conhecimentos de farmacocinética, farmacodinâmica, dose máxima e efetiva, além do intervalo entre as doses, assim como métodos, vias e técnicas de administração, garantindo assim uma administração segura e sem riscos ao usuário.

O Ministério da Saúde e Anvisa, em parceria com Fiocruz e FHEMIG, elaboraram o PROTOCOLO DE SEGURANÇA NA PRESCRIÇÃO, USO E ADMINISTRAÇÃO DE MEDICAMENTOS, PORTARIA Nº 2.095, DE 24 DE SETEMBRO DE 2013. A finalidade desse protocolo é promover práticas seguras no uso de medicamentos em estabelecimentos de saúde, bem como, deverá ser aplicado em todos os estabelecimentos que prestam cuidados à saúde, em todos os níveis de complexidade, em que medicamentos sejam utilizados para profilaxia, exames diagnósticos, tratamento e medidas paliativas. Assim, as orientações contidas nesse protocolo devem ser seguidas em todas as instituições de saúde.

Segundo o Protocolo, a administração de medicamentos é um processo multi e interdisciplinar, que exige conhecimento técnico e prática. Para a administração segura, são necessários conhecimentos sobre Farmacologia, Anatomia, Fisiologia, Microbiologia e Bioquímica.

A etapa de administração é a última barreira para evitar um erro de medicação derivado dos processos de prescrição e dispensação, aumentando, com isso, a responsabilidade do profissional que administra os medicamentos.

Um erro na administração de medicamento pode trazer graves consequências aos pacientes, devendo-se observar: a ação, as interações e os efeitos colaterais.

É fundamental que seja garantida a segurança ao paciente na administração de medicamentos e, para tanto utiliza-se a regra conhecida como os “NOVE CERTOS”:1 – usuário certo; 2 – dose certa; 3 – medicamento certo; 4 – hora certa; 5 – via certa; 6 – anotação certa; 7 – orientação ao paciente; 8 – compatibilidade medicamentosa; 9 – o direito do paciente em recusar a medicação (TEIXEIRA; CASSIANI, 2010).

Salienta-se, também, as informações contidas na RDC nº45 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa, de 12 de março de 2003, que dispõe sobre o Regulamento Técnico de Boas Práticas de Utilização das Soluções Parenterais (SP) em Serviços de Saúde:

 BOAS PRÁTICAS DE PREPARO E ADMINISTRAÇÃO DAS SP

(…)

CONDIÇÕES GERAIS

As atividades de preparo e administração das soluções parenterais devem ser realizadas por profissionais habilitados e em quantidade suficiente para seu desempenho.

(…)

CONDIÇÕES ESPECÍFICAS

É de responsabilidade do farmacêutico estabelecer os procedimentos escritos para o preparo das SP quanto a fracionamento, diluições ou adições de outros medicamentos.

Os serviços de saúde devem possuir uma estrutura organizacional e de pessoal suficiente e competente para garantir a qualidade na administração das SP, seguindo orientações estabelecidas neste Regulamento.

O enfermeiro é o responsável pela administração das SP e prescrição dos cuidados de Enfermagem em âmbito hospitalar, ambulatorial e domiciliar.

A equipe de Enfermagem envolvida na administração da SP é formada pelo enfermeiro, técnico e ou auxiliar de Enfermagem, tendo cada profissional suas atribuições específicas em conformidade com a legislação vigente.

O enfermeiro deve regularmente desenvolver, rever e atualizar os procedimentos escritos relativos aos cuidados com o paciente sob sua responsabilidade.

O enfermeiro deve participar e promover atividades de treinamento operacional e de educação continuada, garantindo a atualização da equipe de Enfermagem.

O Decreto lei nº 94.406 de 1987 que regulamenta a Lei nº 7.498 que dispõe sobre o exercício profissional da Enfermagem, em seu artigo 8º, relata as competências do enfermeiro, destacando entre outras: “O planejamento, organização, coordenação, execução e avaliação dos serviços de assistências de Enfermagem e a prescrição da assistência de Enfermagem.”

Sendo a administração de medicamentos fase importante na assistência de Enfermagem, cabe ao(à) enfermeiro(a) a implementação das medidas necessárias para a prática segura neste processo. Assim, deve aplicar a Sistematização da Assistência de Enfermagem, através da execução das cinco etapas do Processo de Enfermagem, conforme preconizado na Resolução Cofen 358/09.

Assim, salientamos que a administração de medicamentos deve seguir as medidas recomendadas acima, além das de biossegurança individual, coletiva e do ambiente, devendo essas estar previstas em protocolos institucionais referendados bibliograficamente.

A aprovação desse projeto de Lei, sem amplo debate com as demais categorias profissionais que prestam cuidado em saúde, fere princípios básicos e fundamentais do Sistema Único de Saúde (SUS).

O Coren-RS reafirma seu compromisso na defesa do SUS, com acesso universal da população aos serviços públicos de saúde com segurança e qualidade na assistência prestada, bem como, na defesa das prerrogativas legais da profissão de Enfermagem.

Por todo o exposto esse Conselho, representando os(as) profissionais de Enfermagem, exigirá aos órgãos competentes o veto ao Projeto de Lei 112/2016.

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