CARTA
AOS MINISTROS E MINISTRAS DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL Piso
da Enfermagem: essencial para a saúde da sociedade brasileira
“Acho
que os sentimentos se perdem nas palavras. Todos deveriam ser
transformados em ações, em ações que tragam resultados”, Florence
Nightingale, precursora da Enfermagem moderna
A
Enfermagem do Brasil se dirige respeitosamente aos Excelentíssimos
Senhores Ministros e Excelentíssimas Senhoras Ministras do Supremo
Tribunal Federal (STF), em uma das quadras mais importantes da
história da categoria, com base em dados econômicos, sociais e
científicos, para pedir encarecidamente que votem pela
constitucionalidade e aplicabilidade imediata do Piso Nacional da
Enfermagem, nos autos da ADI 7.222, conforme regulamenta as Emendas
Constitucionais 124 e 127/2022, a Lei 14.434/2022 e a Lei
14.581/2023.
Todas
as exigências legais foram cumpridas para fazer valer o Direito. Com
base na legislação em epígrafe, o Ministério da Saúde já
publicou a Portaria 597/2023, regulamentando e especificando o
repasse de recursos na ordem de R$ 7,3 bilhões para que estados,
municípios e entidades do setor privado – que atendem pelo menos
60% de pacientes provenientes do Sistema Único de Saúde (SUS) –
cumpram o Piso da Enfermagem a partir de 2023. Da mesma forma, foi
assegurado o repasse de R$ 2 bilhões para as Santas Casas cumprirem
o Piso.
A
distribuição de recursos está lastreada em dados oficiais e são
suficientes para colocar o Piso da Enfermagem em vigor. Nesse mesmo
sentido, ficou comprovado durante o processo legislativo e nos autos
da ADI 7.222 que o setor privado tem plenas condições econômicas
de cumprir a lei.
É
necessário dizer que o direito ao Piso foi conquistado com amplo
apoio popular e aprovado pelo Congresso Nacional, em sucessivas
votações, com pelo menos 97% de apoio parlamentar em todas as
oportunidades. Da mesma sorte, as matérias foram sancionadas em
todas ocasiões necessárias por dois Presidentes da República, de
espectros políticos completamente diferentes, depois que o trabalho
da Enfermagem se tornou notoriamente conhecido, por causa da
emergência de saúde pública decorrente da pandemia. Notadamente,
criou-se uma espécie de unanimidade na política e na sociedade em
torno da justiça salarial para toda a categoria.
Assim
como a sociedade brasileira, a Organização Mundial da Saúde (OMS),
a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) e a Organização para
Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) recomendam em
uníssono a melhoria das condições de trabalho dos profissionais de
Enfermagem, para a garantia dos serviços de saúde e de
desenvolvimento do país. Segundo esses organismos, investir em
profissionais de Enfermagem e obstetrícia não só permitirá
avanços no campo da saúde, mas também contribuirá para promover a
igualdade de gênero e garantir trabalho decente e crescimento
econômico.
São
tempos difíceis para a Enfermagem. O desafio diário de cuidar das
pessoas tem sido massacrante e insuportável diante dos salários
miseráveis, jornadas exaustivas, descanso indigno, preconceito,
assédio moral e sexual, transporte precário, insegurança,
violência e sobrecarga com as responsabilidades do lar e da família.
A
Enfermagem responde por aproximadamente 59% da força de trabalho na
área da saúde. No Brasil, são mais de 2,8 milhões de
profissionais da categoria, responsáveis por cuidar, observar,
executar o tratamento, confortar a dor e amparar o ser humano em suas
necessidades mais genuínas.
A
Enfermagem é a única categoria da saúde que possui jornadas de
mais de 44 horas semanais. O duplo vínculo empregatício também é
uma realidade imposta pelos baixos salários aos profissionais da
área, que fustigados pelos salários miseráveis, acabam tendo de
dobrar plantões, acumular mais de um emprego ou fazer “bicos”.
A
realidade salarial da categoria é estarrecedora. Segundo o estudo
Perfil da Enfermagem no Brasil (Fiocruz, 2015), 1,8% da categoria
recebe até menos de um salário mínimo por mês. Neste mesmo
período, no setor público, 14,4% ganhava até R$ 1.000,00 por mês
e 45% ganhava, no máximo, R$ 2.000. No setor privado, 23,1% recebiam
apenas R$ 1.000 e 31,9% não passavam de R$ 2.000 mensais. De 2015
para cá, os salários não tiveram aumento real e os profissionais
de Enfermagem perderam ainda mais diante da crise econômica e da
pressão inflacionária.
Aproximadamente
50% da força de trabalho da Enfermagem esteve na linha de frente do
combate à Covid19. A categoria diagnosticou e cuidou de
aproximadamente 34 milhões de pessoas, aplicando mais de 700 milhões
de doses de vacina. No entanto, em uma triste contrapartida, o Brasil
foi o país que registrou o maior índice de mortalidade entre
profissionais de Enfermagem no mundo durante a pandemia. Portanto, é
também pela dignidade dos que se foram, de suas famílias e dos que
ainda estão na linha de frente que defendemos a implementação do
Piso.
Enquanto
milhões de profissionais da saúde recebem salário mínimo por
jornadas exaustivas, em condições insalubres, donos de
conglomerados de hospitais e proprietários de planos de saúde estão
ficando cada vez mais ricos e se tornando bilionários, em um país
cada vez mais sedimentado pela desigualdade e desumanidade. Assim,
mais uma vez é necessário ir ao judiciário reafirmar a essência
de profissionais que mesmo diante das maiores ameaças, como foi a
pandemia, continuam firmes em seu ofício, fazendo tudo o que podem
pela vida dos pacientes.
Os
que hoje advogam contra o Piso nacional da Enfermagem deveriam ser os
primeiros a ser favoráveis, pois são grandes beneficiários do
trabalho da categoria. No entanto, preferem agir como defensores
intransigentes de desigualdades insustentáveis. Ainda ontem,
chamavam os profissionais da linha de frente de heróis. Hoje, negam
até o básico.
É
tempo de fazer justiça. De acordo com o Inciso V, Art. 7º da
Constituição Federal, é direito do trabalhador um “piso salarial
proporcional à extensão e à complexidade do trabalho”. Não
estamos pedindo nada demais, apenas que se cumpra a Constituição
Cidadã.
Por
todos os argumentos expostos, acreditamos que a implementação do
Piso da Enfermagem permitirá a erradicação dos salários
historicamente miseráveis da categoria e estabelecer condições de
vida digna e de trabalho decente para o maior contingente de
profissionais de saúde do país.
Respeitosamente,
CONSELHO
FEDERAL DE ENFERMAGEM – COFEN CONSELHOS
REGIONAIS DE ENFERMAGEM – COREN Enfermeiros,
Técnicos, Auxiliares de Enfermagem e Parteiras |